Álbuns Clássicos: Os Anos 1960 muito além de Beatles e Stones

 
Quando uma pessoa leiga em música é perguntada sobre a década de 1960 rapidamente pensa em rock; quando uma pessoa conhecedora minimamente de rock pensa no mesmo período logo já visualiza a febre de Beatles e Rolling Stones.
O que precisa ser analisado é que, além da invasão britânica acontecida naquele período, principalmente atingindo o mercado americano, também há a onda de bandas americanas que, se não fizeram o sucesso estrondoso de Lennon & McCartney e Jagger & Richards, pelo menos atingiram um patamar de excelência na forma de tocar e no experimentalismo passível de maior aprofundamento por quem se interessa pela questão.
Além disso, mesmo dentro da Inglaterra havia gente que possuía muita potência sonora para também dialogar com a juventude europeia.
É óbvio que ninguém irá comparar a importância social, midiática e até financeira que os rapazes de Liverpool acometeram ao mundo ou a selvageria com que Jagger assombrou seu público com o trabalho mais alternativo dessas outras bandas, mas uma coisa é clara: a qualidade musical desses outros artistas se equiparava diversas vezes com o que era transmitido pelo Fab 4 ou pelos Rolling Stones.
Abaixo, divulgo uma lista com alguns grupos contemporâneos de Beatles e Stones oriundos tanto dos EUA quanto da Grã-Bretanha e seus respectivos discos lançados dentro da década de 1960.
Muitas vezes eles são relegados a um segundo plano por quem não compreende bem aqueles anos malucos, mas que têm lugar cativo no coração dos apaixonados por música boa e que realizam uma pesquisa mais apurada em busca de joias raras do rock.
Observação: Desde já explico que as obras-primas “Blonde on Blonde” de Bob Dylan e “Are you Experienced” de Jimi Hendrix não se encontram aqui, pois mais à frente estarão num post solo.

 Love – “Da Capo”
A banda comandada por Arthur Lee já havia feito algum sucesso com o álbum de estreia homônimo no qual continha uma versão de “My Little Red Book” de Burt Bacharach, mas foi com “Da Capo” lançado em novembro de 1967 que são conhecidos até hoje.
Trata-se de uma produção cheia de violões acústicos seguidos de arranjos de metais não muito usuais que viajam num folk rock muito bem executado tendo ainda bonitas nuances de psicodelia que influenciariam Sid Barret no primeiro trabalho do Pink Floyd.
Além disso, é notável a inspiração de algumas passagens da sonoridade deste trabalho em músicas do Led Zeppelin e até mesmo em Stone Roses e Primal Scream mais à frente.
Até mesmo Jim Morrison listou o Love e este “Da Capo” como um de seus discos favoritos.
Por fim, talvez tenha sido o primeiro LP a contar apenas com uma canção no lado B do vinil, a maravilhosa “Revelation”.
Lado A
 
1 – “Stephanie Knows Who” – 2:33
2 – “Orange Skies” (Bryan MacLean) – 2:49
3 – “¡Que Vida!” – 3:37
4 – “7 and 7 Is” – 2:15
5 – “The Castle” – 3:00
6 – “She Comes in Colors” – 2:43
 
Lado B
 
1 – “Revelation” (Lee, Bryan MacLean, Johnny Echols, Ken Forssi) – 18:57

 
Bufallo Springfield – “Bufallo Springfield Again”
 
Um pouco antes de Crosby Stills Nash & Young existiu essa pérola do rock dos anos 60 chamada Bufallo Springfield que tinha em sua base Neil Young e Stephen Stills, além dos músicos Richie Furey e Bruce Pulmer.
A vida curta da banda (1966-1968) não explica a qualidade com que seus integrantes realizaram rapidamente quatro álbuns, dentre os quais considero o segundo o melhor de todos.
“Bufallo Springfield Again” é um trabalho conciso e preciso guiado por caras que já eram habituês da cena folk americana quando decidiram montar o grupo.
Portanto, pensar na estruturação de tudo aconteceu com Neil Young, Stephen Stills e seus companheiros posteriores de palco ou de estúdio é inviável se não se iniciar a conversa por meio da sonoridade deste disco.
Além disso, as colaborações de David Crosby, pitacos de Phil Spector e Jack Nitzsche na produção e uma pós-produção perfeita fazem deste LP uma obra rara no rock americano até hoje.
Lado A
1 – Mr. Soul – 2:41
2 – A Child’s Claim to Fame – 2:10
3 – Everydays – 2:43
4 – Expecting to Fly – 3:45
5 – Bluebird – 4:30
 
Lado B
 
1 – Hung Upside Down – 3:27
2 – Sad Memory – 3:01
3 – Good Time Boy – 2:14
4 – Rock & Roll Woman – 2:45
5 – Broken Arrow – 6:14

 
Beach Boys – “Pet Sounds”
 
Eu sei que não preciso ficar defendendo muito esta obra-prima do Beach Boys, mas ao mesmo tempo acredito ser necessário mostrar sempre que possível o quão valorosa é a qualidade sonora, experimental e potência atmosférica com que são executadas as músicas deste grupo californiano.
Comparado muitas vezes em genialidade com “Sgt. Peppers…”, a discussão parece se tornar reducionista e minimalista, pois o conteúdo do disco é mais do que genial, é uma delícia de se escutar.
A banda liderada por Brian Wilson e baseada em sua família, já que faziam parte dela também seus irmãos Carl e Dennis, além do primo Mike Love e do amigo Alan Jardine, utiliza o trabalho de 1966 para incluir no seu rotulado surf rock coisas das mais experimentais possíveis.
Neste balaio é jogada música erudita, folk, country, blues, bossa nova, música havaiana e até pitadas de um hard rock que ainda não existia.
Mas não se faz dessa mistura apenas experimentalismo vazio. Os sons são diversificados, mas coesos entre si e isso faz com que se queira escutar o álbum inteiro sempre de uma vez só.
Inclusive, o envolvimento de Brian com drogas alucinógenas não era sintoma de um comportamento junkie, mas de um trabalho de análise para utilização nas canções, motivo pelo qual o LP se torna uma das produções mais inspiradoras para quem gosta até hoje de rock psicodélico.
Até mesmo a produção de Brian Wilson, calejado por já estar no décimo primeiro disco da banda naquele momento facilitou o processo criativo e fez com que isso não ficasse apenas na sensação, mas também na audição de qualquer pessoa que o faça ainda nos dias atuais.
Lado A
 
1 – Wound’t Be Nice – 2:23
2 – You Still Believe in Me – 2:30
3 – That’s Not Me – 2:30
4 – Don’t Talk (Put Your Head on My Soulder) – 2:53
5 – I’m Wainting for the Day – 3:06
6 – Let’s Go Away for Awhile – 2:54
7 – Sloop John ‘B’ – 2:54
 
Lado B
1 – God Only Knows – 2:46
2 – I Know There’s an Answer – 3:10
3 – Here Today – 2:55
4 – I Just Wasn’t Made For These Times – 3:10
5 – Pet Sounds – 2:23
6 – Caroline No – 2:54

 
 The Zombies – “Odessey and Oracle”
 
Esta banda britânica fez algum sucesso em 1966 com o single “She´s Not There”, tendo chegado ao segundo lugar nos Estados Unidos.
 
Como não atingiram outros pódios com as canções posteriores, e após três anos praticamente em excursão, os Zombies, em 1966, desiludidos com a indústria fonográfica, resolveram se separar.
 
Mas o baixista Chris White convenceu os colegas a gravarem um álbum de despedida sob o pretexto de não estarem mais sob a pressão de gravadora nenhuma e desta forma a liberdade com que lidaram com a gravação resultou neste disco.
 
O disco foi gravado no lendário Abbey Road Studios, um pouco depois dos Beatles gravaram “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, portanto, parece que havia alguma magia musical no ar ainda.
 
Uma curiosidade em torno do nome do LP “Odessey and Oracle” é que Terry Quirk, responsável pelo projeto gráfico e que era vizinho de apartamento de White, errou na grafia da palavra “Odyssey”, mas o grupo resolveu deixar como estava, e capa foi para as lojas dessa mesma forma.
 
O interessante é que mesmo tendo criado esta obra prima o grupo se desfez logo em seguida ao lançamento.
 
Para se ter uma ideia, Al Kooper, diretor da CBS, ouviu o álbum durante uma viagem à Inglaterra e convenceu a gravadora a lançar a faixa “Time of the Season” como single.
A canção atingiu o número absurdo de dois milhões de cópias em todo o mundo e finalmente se transformou no maior sucesso dos Zombies, ultrapassando o que “She’s Not There” havia feito no começo da carreira dos caras.
 
Lado A
 
1 – “Care of Cell 44” – 3:53
2 – “A Rose for Emily” – 2:17
3 – “Maybe After He’s Gone” – 2:31
4 – “Beechwood Park” – 2:41
5 – “Brief Candles” – 3:38
6 – “Hung Up on a Dream” – 2:58
 
Lado B
 
1 – “Changes” – 3:16
2 – “I Want Her, She Wants Me” – 2:50
3 – “This Will be Our Year” – 2:07
4 – “Butcher’s Tale (Western Front 1914)” – 2:45
5 – “Friends of Mine” – 2:15
6 – “Time of the Season” – 3:31

 
 13th Floor Elevators – “The Psychedelic Sounds of the 13th Floor Elevators”
 
A banda formada em Austin, Texas, já chegou estraçalhando logo em seu disco de estreia.
“The Psychedelic Sounds of the 13th Floor Elevators” é um compêndio de tudo aquilo que a sua própria cidade significaria para a música americana até os dias de hoje, seja por meio do festival de rock psicodélico “Austin Psych Fest” (antigo Levitation) ou no evento indie “Austin City Limits Music Festival”.
É um som de garagem impulsionado pela maneira brusca e pesada com que todos os integrantes tocam seus instrumentos, além de se posicionar entre as bandas daquela década de 60 que conseguiram melhor traduzir em seu ambiente sonoro o rock psicodélico.
O álbum foi lançado em 1966 e nesse período o vocalista e líder da banda Tommy Hall já se aprofundava na pesquisa (e uso contínuo) de drogas alucinógenas com o intuito de impulsionar o processo criativo e artístico da banda.
O resultado é que temos uma sonoridade que poderia ser conhecida como avó do punk rock dos anos 70. Tanto isso é verdade que todos da banda Television tem como álbum de cabeceira essa preciosidade da indústria fonográfica.
Do disco saiu o single “You Are Gonna Miss Me”, mas são todos os outros petardos que fazem deste LP uma das primeiras captações de psych rock na história que, misturado às loucuras experimentais de Hall, acabou servindo de influência para Man or Astroman?, ZZ Top, Primal Scream, Black Crowes e Jesus and Mary in Chain.
Uma curiosidade: o termo 13th Floor Elevators foi inventado por um psiquiatra em 1957 para descrever as alterações mentais motivadas pela ingestão de drogas alucinógenas, mas se popularizou por meio dos escritores Aldous Huxley e Timothy Leary em descrições de seus livros.
Lado A
 
 
1 – “You Don’t Know (How Young You Are)” (Powell St. John)
2 – “Through the Rhythm” (T. Hall, S. Sutherland)
3 – “Monkey Island” (Powell St. John)
4 – “Roller Coaster” (T. Hall, R. Erickson)
5 – “Fire Engine” (T. Hall, S. Sutherland, R. Erickson)
6 – “Reverberation” (T. Hall, S. Sutherland. R. Erickson)
 
Lado B
 
1 – “Tried to Hide”* (T. Hall, S. Sutherland)
2 – “You’re Gonna Miss Me” (R. Erickson)
3 – “I’ve Seen Your Face Before (Splash 1)” (C. Hall, R. Erickson)
4 – “Don’t Fall Down” (T. Hall, R. Erickson)
5 – “The Kingdom Of Heaven (Is Within You)” (Powell St. John)

  
The Kinks – “The Kinks are the Village Green Preservation Society”
 
O ano é 1968 e Ray Davies despirocou.
Os caras tinham feito muito sucesso tanto no seu país natal, a Inglaterra quanto nos EUA, mas foi na terra do tio Sam que houve uma briga de Ray Davies com um diretor de tv local e depois disso nunca mais as portas das emissoras televisivas ou de rádio se abriram para a banda.
Além disso, Ray e Dave Davies, irmãos de sangue, queriam tirar o sangue um do outro, enquanto que os outros dois integrantes do grupo, Peter Quaife (baixo) e Mick Avory (bateria) achavam que Ray os estava transformando somente numa banda de apoio dele.
Os caras eram doidos e isso não era um projeto de marketing não, eles realmente não batiam bem.
“The Kinks Are the Village Green Preservation Society” é o sexto álbum de estúdio dos caras e foi lançado em novembro de 1968. Ele ficaria mais famoso por ter sido o último álbum do quarteto original, mas é uma pena que muita gente não perceba a genialidade contida nele.
Trata-se de uma coleção de vinhetas temáticas acerca do modo de vida na cidade grande e urbana inglesa em contrapartida com a tranquilidade e monotonia do cotidiano rural. É mais do que apenas um álbum conceitual, pois critica a mudança comportamental da sociedade inglesa pós-guerra.
O disco foi montado a partir de canções escritas e gravadas ao longo dos dois anos anteriores, mas é importante salientar o trabalho de edição que fez com que as canções se situassem muito bem entre elas num lamento sobre o falecimento de antigas tradições inglesas, como a cordialidade entre as pessoas, a vida em família e uma perda da calmaria provinciana que se percebia no ar de qualquer parte da Inglaterra.
Mais interessante pensar que tudo isso saía da cabeça de um cara com apenas 24 anos, mas com uma percepção que só foi compreendida mais tarde pelos sociólogos europeus.
O LP, mistura de rock cru com muita inclusão de ambientes bucólicos, é  considerada uma das obras mais influentes e importantes dos Kinks, mas só vendeu cerca de 100.000 cópias.
Em 2003, o álbum foi classificado no número 255 na lista de 500 maiores álbuns da Revista Rolling Stone.
Lado A
 
1 – “The Village Green Preservation Society” – 2:54
2 – “Do You Remember Walter?” – 2:28
3 – “Picture Book” – 2:36
4 – “Johnny Thunder” – 2:32
5 – “Last of the Steam Powered Trains” – 4:11
6 – “Big Sky” – 2:52
7 – “Sitting by the Riverside” – 2:24
8 – “Animal Farm” – 3:02
Lado B
 
1 – “Village Green” – 2:12
2 – “Starstruck” – 2:27
3 – “Phenomenal Cat” – 2:39
4 – “All of My Friends Were There” – 2:26
5 – “Wicked Annabella” – 2:44
6 – “Monica” – 2:21
7 – “People Take Pictures of Each Other” – 2:20

Temples é uma pérola dos anos 60 nos dias de hoje

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A banda atua no rock psicodélico inglês, formada em Kettering, Northamptonshire, em 2012, pelo cantor e guitarrista James Edward Bagshaw e o baixista Thomas Edison Warmsley. Eles têm recebido considerável atenção da imprensa durante a sua curta existência e foram citados por Johnny Marr e Noel Gallagher como a melhor nova banda na Grã-Bretanha.

Foi formada inicialmente como um projeto de estúdio em casa, em meados de 2012. A dupla já havia trabalhado junto anteriormente num banda chamado The Moon, com Bagshaw tendo também co-liderado outra banda antes, a Kettering Sukie, que formou em 2006 e alcançou o n º 1 do “Chart UK Indie”, badalada parada indie inglesa, com seu single de estreia “Pink-A-Pade”.

A banda inicia suas atividades tendo alguma experiência no mundo da música. A dupla responsável pelo grupo produziu faixas para o YouTube, algo que chamou a atenção do fundador da Heavenly Recordings, Jeff Barrett, que concordou em lançar o single de estréia da banda em novembro de 2012.
Dessa forma, Bagshaw e Warmsley, recorreram a outros colegas residentes em Kettering para complementar a base que começaria a divulgar seu som.

Foram chamados o baterista Sam Toms (Secret Fix e ex-Koolaid Electric Company) e o tecladista Adam Smith e começaram a ensaiar como uma banda, para que pudessem desempenhar as suas músicas ao vivo.

O problema disso é que nunca haviam feito apresentações como uma banda. O processo, entretanto, não causou nenhum trauma em nenhum dos músicos. A banda acabou por promover seu segundo single “Cores To Life”, em junho de 2013 e conseguiu lançar o álbum “Sun Structures” em fevereiro do ano passado.

A arrancada do Temples como banda de palco tem início com algumas apresentações sendo suporte para grupos maiores como o Suede, Mystery Jets, Kasabian e The Vaccines no Reino Unido.

Neste ano, a banda embarcou em uma turnê pela Europa, América do Norte e Austrália e até um ranzinza como Noel Gallagher tem reclamado da falta de músicas do Temples nas rádios inglesas.

Quanto ao som da banda parece que fomos transportados para os anos 60 pela sua ambientação sonora e por causa de seu clima psicodélico que se encaixa perfeitamente na amarração realizada entre os instrumentos do grupo. Mas é o teclado que dá, ao mesmo tempo, a ideia desse assombramento sessentista e a diversidade sonora para entendermos que ainda se trata de um grupo dos dias atuais. Nesse ponto são superiores ao psicodelismo de Toy e The Warlocks, outros representantes do rock dos anos 60 atualmente.

Desse modo, não perca tempo e vá atrás de ouvir os caras antes que eles peguem a máquina do tempo e voltem para a época do início de carreira de Beach Boys, The 13th Floor Elevators, The Zombies e Byrds.

Ouça o álbum “Sun Structures” completo abaixo: