Nick Cave, o rei da balada!

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Há muito tempo que já deveria ter algum disco de Nick Cave nessa sessão de álbuns clássicos, mas a dúvida sempre recaía sobre qual bolacha constar nesse quesito de obra inabalável.

A resposta é obviamente difícil já que todos os trabalhos do músico com sua banda Bad Seeds são impecáveis tanto na produção quanto na qualidade das canções.

“Your Funeral… My Trial” tem seu charme, “Let Love In” é arrebatador, “Nocturama” é um trabalho de excelência, além do último “Push the Sky Away” que é lindíssimo. Tudo isso só para ficar em poucos exemplos.

A questão é que não pude fugir da alma que “Murder Ballads” possui e o sentimento que provoca em seus ouvintes é de arrepiar. O disco é espetacular do início ao fim e ainda se utiliza de ótimas parcerias do cantor com P.J. Harvey (naquele momento em um relacionamento com ele), Shane McGowan e Kylie Minogue.

Para completar, o trabalho da Bad Seeds é formidável e não há o que dizer sobre a instrumentação utilizada em sua produção.

Tratando-se de um disco de baladas, é de se imaginar que isso simplificaria o trabalho pelo uso de equipamentos acústicos, mas não é o que ocorre com o álbum. A utilização de violões acústicos é óbvia, mas também há na sincronia com a voz de Cave o piano, o órgão tradicional, o órgão Hammond maracas, tamborins, elementos de percussão, bells e uma infinidade de tantos outros.

A capa soturna, pincelada com cores frias, retrata uma casinha no meio de um lugar ermo e distante no centro de alguma floresta coberta pela neve. O sentimento que ela passa é o mesmo que o da música do álbum: uma sensação de solidão e tristeza por uma saudade de algo que não volta mais. Sim, é um disco extremamente para baixo, mas de uma qualidade incrível.

A produção ficou a cargo de Victor Van Vugt e dos integrantes da Bad Seeds e saiu pela Mute Records em fevereiro de 1996. Os trabalhos em estúdio duraram cerca de 3 anos e isso se traduz no cuidado com que o disco é entregue a que o escuta.

Tudo começa com “Song of Joy”, uma narração de Nick seguida por um trabalho de percussão forte que parece uma introdução longa sobre o que será o disco todo.

A seguir, há a balada “Stagger Lee” que possui um trabalho de guitarra rasgada numa batida que hipnotiza, além de um baixo intocável e uma bateria contida segurando a onda para que o senhor Cave vocifere sem ser necessário gritar. Alguns efeitos sonoros durante a canção garantem também um tom inquieto.

“Henry Lee” é simplesmente o encontro de dois artistas inigualáveis no cenário musical mundial. A parceria entre Cave e P.J. Harvey é bela e ao mesmo tempo tensa. O trabalho do piano apenas dá a ambientação necessária para que os dois cantores duelem durante a canção que conta uma história triste sobre o romance impossível do personagem-título. Junto a isso há apenas uma percussão quase imperceptível. Ah, é o videoclipe é lindo!

A belíssima “Lovely Creture”, que parece ser uma ode à musa P.J. Harvey, vai se intensificando como uma mistura entre os órgãos que aparecem ao fundo, o piano contido e o backing vocal suave feminino que preparam o terreno para as guitarras, as maracas e o vocal cavernoso de Nick.

A quinta música do álbum é um conto de fadas que, assim como todas as outras músicas do disco, parecem sempre retratar outro tempo, por conta não só de sua ambientação, mas pela presença sempre de um discurso bucólico, pastoril que Nick Cave leva adiante. A parceria agora é com a cantora pop Kylie Minogue e o uso de violinos e harpas só dá um tom triste e soturno para a canção sobre a mulher que virou uma rosa.

A tensão está presente desde o início da canção e a voz suave e doce de Minogue funciona muito bem ao fazer diferença ao tom grave que Cave empenha. Uma das melhores baladas já feitas por um compositor nos últimos tempos.

“The Curse of Millhaven” é um longo relato sobre a maldição que tomou conta da cidadezinha de Millhaven. O caos que se instala com uma série de instrumentos sendo tocados de maneira desorganizada no início da música logo se transforma numa balada bem ao estilo do velho oeste americano do século XIX. Algumas ferramentas sonoras auxiliam nesse ambiente empoeirado como os violinos e o baixo batido com força, além do piano Hammond. A bateria é forte e densa casando perfeitamente com a narração amalucada de Cave. A música mais pesada e rápida do disco.

“The Kindness of Strangers” é uma volta à depressão numa baladinha bem interpretada e acompanhada pela Bad Seeds.

Por outro lado, “Crown Jane” se baseia numa pegada de jazz reinterpretando o tradicional folk americano. Sei que não precisa mencionar, mas é mais uma prova da competência e variação com que os instrumentistas da banda de Nick Cave trabalham.

“O’Malleys Bar”, a penúltima do álbum, é uma narração em que o vozeirão de Nick se suaviza mais para ser acompanhado por um órgão e um baixo pesadão. Por ser a mais comprida música de “Murder Balads”, serve também para uma demonstração de virtuoses durante seus mais de quatorze minutos.

Por fim, um dos temas preferidos do disco e de Nick, a morte, volta a atuar em “Death Is Not the End”, adaptação da obra original de Bob Dylan. Bonito ver como Nick coloca sua personalidade na música e ainda há a ajuda dos vocais de outros membros da banda, Kylie Minogue e Shane MacGowan (ex- Pogues).

Dessa forma, dizer que estamos diante de um clássico da história fonográfica parece natural para uma banda que sempre fez seus discos sem estardalhaço e sempre provou realizar trabalhos de excelência.

“Murder Balads” recebeu alguns prêmios da indústria musical como o ARIA Awards pelo dueto com Kylie Minogue em “Where the Wild Roses Grow” considerado o melhor do ano de 1996 e Nick Cave foi nominado com um dos melhores cantores daquele ano no MTV Awards.

Abaixo a lista completa das músicas em ordem de execução no álbum

1 – “Song of Joy”
2 – “Stagger Lee
3 – “Henry Lee”
4 – “Lovely Creature”
5 – “Where the Wild Roses Grow”
6 – “The Curse of Millhaven”
7 – “The Kindness of Strangers
8 – “Crow Jane”
9 – “O’Malley’s Bar”
10 – “Death Is Not the End”

Stagger Lee

Henry Lee

Where the Wild Roses Grow

Crow Jane

Death is not the End