Mesoperiferia: conheça este projeto de ação artística realizado em São Paulo

O projeto Mesoperiferia é um coletivo cultural que mostra a força da periferia na condução de práticas artísticas nos bairros pobres do município de São Paulo.

Pela grandeza da cidade e pela diversidade de pessoas que vivem longe do centro financeiro e das facilidades que o morador rico possui em termos de opções de lazer e cultura é importante saber que haja um projeto tão engajado quanto esse que passamos a conhecer através de alguns colaboradores.

No momento, o pessoal engajado nas atividades da Mesoperiferia estão no meio da produção de um documentário e tem solicitado todo tipo de apoio necessário para o prosseguimento da obra.

Narrando de forma poética a história do movimento que, desde 2001, atua na zona norte de São Paulo com a organização e produção de eventos como o Sarau do Trem e a Cicloesia – poesia em movimento e oficinas de cinema com alunos de escolas públicas, o filme tende a ser uma mistura de ficção com realidade, na qual passeamos pelas vielas dos bairros de Vila de Medeiros, Jardim Brasil, Vila Sabrina, Edu Chaves, Jaçanã, entre outros, conhecendo seus personagens e características peculiares.

Deste modo, o blog preparou algumas perguntas a serem respondidas por essa galera que promove tão bem a cultura entre os jovens da periferia e o professor Rogério Nogueira fez a gentileza de nos responder.


O que é exatamente o projeto Mesoperiferia?

O movimento cultural Mesoperiferia surgiu em 2001, quando um grupo de jovens do distrito de Vila Medeiros organizou um evento onde percorreram o bairro levando sua poesia para os demais moradores da região. Em um exercício, até mesmo, de conhecimento e reconhecimento do lugar onde moravam, saíram com suas bicicletas declamando poesias e contagiando pessoas de todas as idades. Esta foi a “1ª CICLOESIA: Poesia em movimento na Zona Norte – Pela não violência através da justiça social.”

A partir daí, conseguiram um espaço para inserir poesia e realizar um sarau aberto a quem quisesse dividir suas produções poéticas com os demais, chamado Sarau do Lê. O Sarau do Trem (SP-Parapiacaba), organizado em 2002, também fez parte das atividades organizadas pelo movimento.

Atualmente, focou sua atuação projetos de oficinas de cinema e audiovisuais com alunos de escolas públicas, entre outras intervenções.

O nome do movimento surgiu de um neologismo que significa morar entre as periferias, estar num local conflitante entre ter e não ter equipamentos públicos e desenvolvimento socioeconômico.  Surge da consciência da carência de eventos e espaços para cultura e lazer na região, obrigando o jovem a se deslocar até o centro urbano ou outros bairros para ter acesso a eles.

Em 2007, foi publicado o meu livro de poesias intitulado Mesoperiferia em que relata as ações do movimento Mesoperiferia.


Quais são as principais dificuldades para colocar em prática o plano de ação do projeto?

Todo projeto cultural, que se baseia em ações culturais construídas socialmente, requer muita disposição e identidade cultural com a produção da região na qual se é desenvolvido. As dificuldades são as mesmas do Capão Redondo, de Guaianazes, de Perus… equipamentos culturais inexistentes, formação de público e orçamento zero são alguns exemplos.


Como você imagina que o projeto Mesoperiferia pode interferir positivamente na vida das pessoas dos bairros pobres?

Cremos que o Movimento Mesoperiferia sozinho pouco conseguirá realizar. Nosso foco é o trabalho com cinema e memória.  Pretendemos formar jovens que se interessem pela linguagem cinematográfica e que por meio de parcerias com outros movimentos da região, consigamos criar na região produções próprias, um festival regional de curtas e um estúdio para que mais jovens possam se incentivados, quem sabe, a seguir carreira na área de audiovisual. Temos parcerias com o Salab de Guarulhos, com o Gatacine, no centro de São Paulo, com o Cicas, aqui na zona norte.


Você acha que a arte e a cultura para a população de baixa renda sempre foi negligenciada no país? Se sim, explique métodos que considera possíveis para que a periferia possa alcançar de forma mais objetiva esses bens imateriais.

A atuação do Estado é inversamente proporcional à demanda jovem que existe nas periferias do Brasil. Não é à toa que o tráfico de drogas consegue arregimentar tantos meninos e meninos para o mundo das drogas. O orçamento para as secretarias e ministérios de cultura sempre foram irrisórios. Cremos, por trabalharmos  na área de educação, que as escolas, pela universalidade que alcançou, possa ser um centro de produção de conhecimento e cultura, mas para isso a educação brasileira tinha que ter prioridade. O que esta longe de acontecer.


Você acredita que, diante de tantas ataques à liberdade de expressão e de pensamento, as pessoas mais prejudicadas são mesmo aquelas ligadas ao mundo das artes e o povo mais humilde?

Estamos vendo ultimamente um retrocesso assustador em relação às conquistas sociais, políticas, culturais e artísticas que foram conquistadas com muita luta. Lembro-me, por exemplo, que na gestão de Gilberto Gil no Ministério da Cultura houve uma articulação forte com os movimentos sociais. Evidente que não agradou a todos, como sempre. Mas o segredo é sair dos gabinetes, articular e auxiliar com o mínimo de recursos os movimentos culturais que já estão postos. Talvez retomar esse movimento seja importante nesse momento crítico de conservadorismo que nos cerca.


Como o projeto pode influenciar na luta contra esse tipo de censura do Estado?

Com muita união e parcerias entre os movimentos que sempre lutaram por uma democracia radicalmente popular. Uma das funções da arte, por exemplo, é libertar o indivíduo de todas as amarras construídas pela classe dominante. A partir do momento que sua produção é compreendida, valorizada e incentivada portas sã abertas para a independência de vozes sufocadas pelo sistema.

 


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